terça-feira, 19 de agosto de 2014

O diálogo de identidades na música Olhando Belém

Universidade Federal do Pará
Instituto de Letras e Comunicação
Faculdade de Letras
Disciplina Recursos Tecnológicos
Professora Ivânia Neves
Junho/2014


Flávio Torres
Ivania Melo
Hiraldo Lameira

Introdução

Este trabalho apresenta uma leitura voltada para o diálogo de identidades na música Olhando Belém, de Celso Viáfora e interpretação de Nilson Chaves. O diálogo se estabelece a partir da rejeição que o individuo mostra em relação a própria identidade e passa a desejar a do outro. Ele reconhece os problemas sociais de sua cidade, mas prefere ignorar os problemas da cultura do outro desejando também fazer parte dessa nova “realidade” vista por um olhar turístico, breve, sonhador. Mas para entender esse diálogo que a música Olhando Belém nos oferece é preciso compreender o que é identidade e cultura.

Identidade, para Ferreira (2000), são: “Os caracteres próprios e exclusivos duma pessoa: nome, idade, estado, profissão, sexo, etc.”. Com relação a cultura, ele defini como


Ato, efeito ou modo de cultivar. O complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições, das manifestações artísticas, intelectuais, etc., transmitidos coletivamente, e típicos de uma sociedade. O conjunto dos conhecimentos adquiridos em determinado campo. (FERREIRA, 2000, p. 197)

Então, Identidade cultural é a reunião das características de uma sociedade que tem origem na interação dos indivíduos com fatores externos, o que resulta em uma identidade mutável.



A mídia tem um papel importante nessa (des)construção de ideias. Quem da região Amazônica nunca ouviu comentários sobre o bom relacionamento entre pessoas e animais selvagens pelas ruas das capitais? Como se diariamente fosse comum encontrar faixa inteligente para onças atravessarem a rua ou “jacarovias” para os nossos crocodilianos circularem tranquilamente por nossa cidade. Ou ainda a surpresa de alguns estrangeiros ao perceberem que não andamos nus em nossa aldeia de um pouco mais de 1,4 milhão de habitantes.

Para Patriota (2002, p. 12), essa identidade é o “sentimento de pertencimento a uma cultura nacional”. Hall, em A identidade cultural na pós-modernidade (1999 apud PATRIOTA, 2002) afirma que “uma cultura nacional é um discurso – um modo de construir sentidos que influencia e organiza tanto nossas ações, quanto a concepção que temos de nós mesmos”. Prado (2010, p. 124), com base também nas ideias de Stuart Hall, diz que “as velhas identidades [...] estão em declínio, fazendo com que o sujeito moderno tenha uma identidade fragmentada”. São por influencias externas que a (des)construção da identidade ocorre naquele que observa maravilhado a cultura, o espaço, a região, as características do outro que parecem melhores que a dele (do observador). Vamos observar a música e prestar atenção à letra.


O sol da manha rasga o céu da Amazônia
Eu olho Belém da janela do hotel
As aves que passam fazendo uma zona
Mostrando pra mim que a Amazônia sou eu
E tudo é muito lindo
É branco, é negro, é índio
No rio Tietê mora a minha verdade
Sou caipira, sede urbana dos matos
Um caipora que nasceu na cidade
Um curupira de gravata e sapatos
Sem nome e sem dinheiro
Sou mais um brasileiro
Olhando Belém enquanto uma canoa desce um rio
E o curumim assiste da canoa um Boeing riscando o vazio
Eu posso acreditar que ainda da pra gente viver numa boa
Os rios da minha aldeia são maiores do que os de Fernando Pessoa
(e o sol da manha rasga o céu da Amazônia)
Olhando os meus olhos de verde e floresta
Sentindo na pele o que disse o poeta
Eu olho o futuro e pergunto pra insônia
Será que o Brasil nunca viu a Amazônia
E vou dormir com isso
Será que e tão difícil.



A música descreve a visão de um turista contemplando o cenário amazônico da janela de um hotel localizado as margens do rio. Mas ele vê duas realidades: a Belém que tem rio, aves, sol, branco, negro, índio; e a sua região, poluída, destruída, sem oportunidades. Ao lançar o olhar maravilhado para a paisagem ele não percebe que acaba desviando um pouco a vista de uma Belém das águas. Mas águas dos canais que cortam a cidade e são os nossos “Tietês”. De costas para a realidade, nada romântica, ele já sente que é parte da Amazônia. E justifica que pode ser aceito porque esta é uma terra de todos, onde “tudo é muito lindo, é branco, é negro, é índio”, então, pode ser dele também.


Figura 1 – A identidade em questão


Enquanto o olhar turístico contempla “Belém da janela do hotel”, ele deixa de ver a Belém das ruas, onde não desce apenas a canoa de um curumim, mas uma tribo tinteira. Talvez evite a nossa verdade de propósito, bastando a sua realidade: “No rio Tietê mora a minha verdade. Uma verdade suja, poluída, de caos urbano. Sua declaração afirma que ele é mais de cá do que de lá quando afirma: “Sou caipira / sede urbana dos matos / Um caipora que nasceu na cidade / Um curupira de gravata e sapatos.

O antagonismo é muito presente nesta letra. O autor utiliza um jogo perfeito com as palavras que sempre revelam oposição, sentido contrario. Além de afirmar neste fragmento do texto a sua condição de “ninguém”. Ao usar o termo “caipora” ele revela sua identidade fragmentada, pois, “caipora” é um personagem folclórico representado de diversas formas pelas regiões do país e não apenas uma. Também significa pessoa que dá ou tem má sorte. Também admite que nasceu e mora fora de onde pertence deseja estar. Outra afirmação de perda de identidade é a expressão “sem nome e sem dinheiro” só “mais um brasileiro”. Aqui, confirma não existe identidade. Sem nome é não ter identidade.

Ele não quer ser apenas um brasileiro. Quer pertencer a esta região que junta o curumim e o Boeing no mesmo cenário. O passado e o presente. Embora tenha uma visão apaixonada ele também aponta uma questão de ordem política-social ao sentir que a Amazônia é excluída do Brasil. Mas ainda tem esperança “de que ainda dá pra viver numa boa” porque os rios da sua aldeia “são maiores do que os de Fernando Pessoa”, ou seja, são melhores, são mais belos, são maiores porque são “seus”.

REFERÊNCIAS

A IDENTIDADE em questão.  Imagem do livro A identidade em questão. Rio de Janeiro, 2006. Disponível em: . Acesso em: 20 jun. 2014.

FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio Século XXI: o minidicionário da língua portuguesa. 4. ed. rev. ampliada, – Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2000, p. 371.

IDENTIDADE. Produção: Vanessa Pereira e Thuany Brasil. Interpretes: Alessandra Duarte; Danilo Carvalho; João; Vinicius. Narração: Natalia Ferreira. Áudio: Paula Pascutti. Imagens: Renato Archangelo. Edição: Thamiris Macedo. Filme de Fernando Meirelles e Nando Olival. Adaptação do Grupo Multiplicidade. Disponível em: . Acesso em: 26 jun. 2014.

JENKINS, Henry. Introdução: “venere no altar da convergência”. In: ______. Cultura da convergência. Tradução Susana Alexandria. 2. ed. – São Paulo : Aleph, 2009, p. 25 – 51.

KELLNER, Douglas; SHARE, Jeff. Educação para a leitura crítica da mídia, democracia radical e a reconstrução da educação. Disponível em: <WWW.scielo.br/pdf/es/v29n104/a0429104.pdf>. Acesso em: 12 de abril de014.

PATRIOTA, Lucia Maria. Cultura, identidade cultural e globalização. Qualitas – Revista Eletrônica do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UEPB, v. 1, n. 1, 2002. Disponível em: < http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/view/8/1>. Acesso em: 16 jun. 2014.

PRADO, Juliana do. Culto ao corpo na telenovela: apropriações, consumo e identidades sociais. In: CASTRO, Ana Lúcia de (Org.). Cultura contemporânea, identidades e sociabilidades : olhares sobre corpo, mídia e novas tecnologias. – São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. p. 113-150. Disponível em: . Acesso em: 16 jun. 2014.

VIÁFORA, Celso. Olhando Belém. Intérprete: Nilson Chaves. You Tube. Disponível em: . Acesso em: 20 jun. 2014.



Plano de Aula

1.    IDENTIFICAÇÃO

-     Tema: O DISCURSO DE IDENTIDADES NA MÚSICA OLHANDO BELÉM
-     Público alvo: Alunos do Curso de Letras – Língua Portuguesa
-     Período: 25/06/2014
-     Duração: 50 minutos

2.    OBJETIVOS

-     Geral: Reconhecer e criticar o diálogo de identidades presente na música.
-     Específicos: Pesquisar assuntos relacionados com identidade cultural da região; produzir textos argumentativos para defender sua opinião; questionar os problemas de sua cidade; apresentar de forma clara e objetiva sua pesquisa.

3.    METODOLOGIA

Aula expositiva:

-     Reprodução da música (apenas o áudio).
-     Perguntar o que os alunos identificaram na letra da música.
-     Reproduzir o vídeo com a música.
-     Perguntar novamente a impressão que eles tiveram sobre a música.
-     Interpretação da música utilizando fotos conforme a letra.
-     Explicar a atividade que o aluno apresentada na próxima aula.

4.    MATERIAL

-     Computador.
-     Projetor multimídia.
-     Caixas multimídia.

5.    AVALIAÇÃO

-     O aluno escolherá uma das três propostas (comprovar com fotos; escrever um texto em prosa; ou compor um poema) para mostrar os problemas da cidade e argumentar contra a imagem ufanista que a música apresenta sobre Belém.


O diálogo de identidades na música Olhando Belém

Atividade em Sala de Aula

Diante do assunto apresentado em sala e as discussões a respeito do tema, escolha uma das três propostas abaixo para mostrar os problemas da cidade e argumentar contra a imagem ufanista que a música apresenta sobre Belém.

1          Comprovar com fotos.
2     Escreva um texto em prosa.

3     Compor um poema.


6.    REFERÊNCIAS

FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio Século XXI: o minidicionário da língua portuguesa. 4. ed. rev. ampliada, – Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2000, p. 371.

JENKINS, Henry. Introdução: “venere no altar da convergência”. In: ______. Cultura da convergência. Tradução Susana Alexandria. 2. ed. – São Paulo : Aleph, 2009, p. 25 – 51.
KELLNER, Douglas; SHARE, Jeff. Educação para a leitura crítica da mídia, democracia radical e a reconstrução da educação. Disponível em: <WWW.scielo.br/pdf/es/v29n104/a0429104.pdf>. Acesso em: 12 de abril de014.

PATRIOTA, Lucia Maria. Cultura, identidade cultural e globalização. Qualitas – Revista Eletrônica do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UEPB, v. 1, n. 1, 2002. Disponível em: < http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/view/8/1>. Acesso em: 16 jun. 2014.

PRADO, Juliana do. Culto ao corpo na telenovela: apropriações, consumo e identidades sociais. In: CASTRO, Ana Lúcia de (Org.). Cultura contemporânea, identidades e sociabilidades : olhares sobre corpo, mídia e novas tecnologias. – São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. p. 113-150. Disponível em: . Acesso em: 16 jun. 2014.


Para saber mais: